Itália – Da experiência do limite, novas perspectivas

Experiências de compreensão e superação do limite >> VIDEO (Direção Donato Chiampi )

São protagonistas deste filme um grupo de homens e mulheres que fizeram parte de um laboratório intitulado “Para Além do Limite”. Eles relatam suas experiências sobre como compreendem e enfrentam o encontro com o limite. Aqui relatamos a transcrição completa do filme com a descrição textual das imagens (que também pode ser baixada >> PDF DOCX )

ANTONELLA

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Antonella. Uma mulher de cabelos castanhos e curtos. Ela veste uma blusa de listas azuis e brancas. Enquanto nos fala, da sacada de um prédio antigo, são apresentadas cenas de Marostica, uma cidade italiana: 1) Vista do alto do casario antigo, seus telhados e área verde. 2) Uma grande escadaria diante de um prédio antigo. 3) Ao longe duas mulheres andam na calçada de um pátio e uma delas está apoiada em um andador. 4) Arquibancadas ao redor de uma praça central e rodeadas de casarios. 5) Homens em andaimes estão montando trabalhando sobre as arquibancadas. 6) No interior de um museu estão manequins com roupas antigas. 7) Antonella caminha com apoio de andador 8) Casarios da cidade vistos à distância e próximos. 9) Torres, muros de castelos aparecem entre árvores. 10) Vista da cidade antiga do alto de uma torre.

Meu nome é Antonella, sou casada com Maurizio e temos uma filha. Moramos em Marostica, eu trabalho como funcionária. Gosto de viajar, conhecer, amo a natureza, as suas cores, suas paisagens. A minha vida é uma vida normal e um pouco especial, porque desde pequena convivo com uma doença progressiva que me tira as forças e as capacidades físicas.

Lembro de um momento particular, quando eu era adolescente e devido a uma cirurgia, fiquei longos meses acamada. Lembro-me deste momento como escuro e luminoso. Escuro, porque em um momento perdi toda autonomia, experimentei a dependência dos outros, experimentei a solidão. Mas também luminoso porque olhei dentro de mim mesma e descobri a beleza da vida e também a coragem de vivê-la apesar de tudo.

Bem, a minha é uma vida desafiadora porque cada dia deparo com os meus limites físicos e uma autonomia que vai se reduzindo. Diante de uma nova dificuldade experimento toda a minha fragilidade, ansiedade, medo. Esta luta dura até quando o meu espírito se rebela, mas meu corpo fala outra língua. Esta luta dura até quando não consigo escutar profundamente o meu corpo e acolher este novo limite. Depois me reencontro “nova” e “diferente” de antes, mas sempre eu, Antonella.

CLÁUDIO

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Cláudio. Cláudio está sentado em sua cadeira de rodas motorizada. Ele é grande, possui cabelos grisalhos e veste roupas em tons de azul claro. Ao redor de uma mesa alguns homens jogam cartas e o Cláudio está junto deles. A cena se centra nele e enquanto nos fala outras imagens são apresentadas: 1) Passeio em cadeira motorizada num caminho entre árvores. 2) Riacho, plantas verdes com frutos vermelhos, galhos, corrente de água em curso. 3)Riacho, bosque, passeio em trilha rodeada de verde e plantações.

Conheço a deficiência há muito tempo, desde quando era criança. Há 18 anos estou em cadeira de rodas.

Digo como eu explicava às crianças do fundamental quando me perguntaram: “o que é o limite?” vou usar esta imagem: um funil é feito de duas realidades. É feito de uma taça e de uma saída que vai se restringindo, e nós na vida, é como se fossemos jogados dentro deste funil. Quando o funil fica mais estreito aparece o limite, eis o sofrimento, eis a dor, eis a dificuldade. Talvez ficamos entalados e a vida não flui mais através do funil. “Como fazer?” 

Eu dizia às crianças que é preciso “derreter-se”. A única realidade que nos ajuda a derreter é colocar o outro no centro, as suas necessidades, o seu desejo de ser escutado, de ser amado. Só o amor pode derreter-nos e fazer-nos tão líquidos ao ponto de superar e atravessar a porta estreita do limite.

ANTONELLA

Nem todos desejam se relacionar com o limite. Às vezes, não me encontro à vontade ou rejeitada, isto é e permanece uma ferida. Quando partilhamos estas sensações com os amigos do Laboratório, reforça-se em mim a descoberta que acolher os nossos limites é o segredo para encontrar uma nova liberdade, força, alegria. Não é só fruto da vida, é fruto da vida partilhada.  

CLÁUDIO

Se vivo colocando o outro e o relacionamento com o outro ao centro da minha existência, eis que provavelmente consigo entender porque Deus me ama assim tão imensamente. O meu limite é a possibilidade de doar-me e de reconhecer a plenitude da liberdade do outro que se doa a mim.

CHIARA N.

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Chiara N. Chiara é uma mulher de cabelos curtos e loiros, veste calça azul e blusa branca. Em uma sala de fisioterapia estão alguns equipamentos como espelho, corrimãos e escada. Neste ambiente uma mulher caminha auxiliada pela fisioterapeuta Chiara. Ela é magra, alta, que veste calça e blusa bege, cabelos curtos, pretos e grisálhos. Durante o relato da fisioterapeuta vemos cenas de sua intervenção de atendimento com esta senhora e por fim, a conduz em cadeira de rodas.

Sou fisioterapeuta e trabalho há anos em uma casa de repouso para pessoas idosas e adultos com deficiências psicomotoras graves.

Entrar na aventura do laboratório foi como se diante de mim se abrisse um mundo, do qual antes eu vislumbrava só uma parte. Foi colocar-me diante do fato que eu também devia reconhecer e aceitar os meus limites pessoais. Estou experimentando com os pacientes o quanto é importante procurar sempre a estrada da reciprocidade que me faz descobrir o que recebo do outro durante o trabalho.

MARIA DANIELA

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Maria Daniela. Maria Daniela, uma mulher de cabelos castanhos, lisos e curtos. Ela usa óculos e veste roupa estampada de fundo branco, com flores e formas em cor bege e tons marrons. Ela fala em frente a um lago e ao fundo está uma construção entre árvores. Durante seu relato outras imagens se sucedem: 1) Árvores, um córrego e ponte em arco. 2) Ela passeia com seu marido em frente à fachada de uma casa antiga ou em trilhas, onde vemos também gramado, córrego e pequenas pontes. 3) Plantas aquáticas com flores amarelas estão no córrego. 4) Maria Daniella e seu marido estão na cidade, diante de um pequeno lago em frente à prédios antigos. 5) Cenas no interno da casa com suas duas filhas organizando objetos na cozinha. 6) As duas jovens saem de casa, passeando com um cachorro. 7) As meninas chegam diante de um portão e são recebidas por outra jovem que vem ao seu encontro.

Sou Maria Daniela. Sou casada com Paulo há 25 anos e temos duas filhas, uma com 14 anos e a outra com 17. Trabalho como programadora de informática. Éramos casados há dois anos, quando perdi o uso do braço direito em um acidente de carro.

No Laboratório trocamos ideias, partilhamos nossa vivência e ali coloquei em evidência duas coisas. A primeira foi ter aceitado o meu limite logo, e esta foi a “virada” da minha vida. Por isso, aquilo que tenho hoje, também aquilo que sou, depende justamente desta experiência. E também o relacionamento com meu marido, com Paulo, com as filhas foi muito provado por este fato, foi provado por isto, mas também se aprofundou muito.

GIUSY

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Giusy M. Área aberta com lago, plantas verdes e montanhas ao fundo. Neste ambiente, Giusy, uma mulher de cabelos castanhos, longos e cacheados nos fala. No decorres de sua fala vemos o lago com caíques, árvores e montanhas. No lago Giusy pratica remo.

Sou Giusy. Sou casada e tenho 2 filhos que já estão grandes, e trabalho como enfermeira há mais de trinta anos. Há algum tempo, porém, tive que abandonar o trabalho por motivos de saúde e é por isso que agora desenvolvo uma atividade mais em contato com os meus colegas, em vez de que com os pacientes.

Desde quando iniciei o trabalho com o Laboratório, perguntei-me como poderia me inserir para participar.  Eu, enfermeira, com o meu limite de não poder mais trabalhar em contato com os pacientes. Poderia estar presente como uma pessoa que sente sobre si os limites de não ser capaz de ajudar a irmã com dificuldades motoras. E ainda, podia ser aquela pessoa que vive o próprio limite da doença, o limite de todas aquelas doenças que não são assim tão evidentes, mas que de alguma maneira marcam todos os dias a vida.

MARIA DANIELA

Quando as meninas eram pequenas, para mim não era fácil abraçá-las pela metade. Elas estendiam as mãozinhas e eu podia dar só uma.

Depois cresceram, começaram a ir à escola, começaram as perguntas dos colegas de escola, às vezes impertinentes. Eu me lembro da maior, que voltava para casa e não tinha resposta para estas perguntas. Então, conversamos com elas. Falamos sobre todas as coisas belas que existem na nossa família. Lembro-me também da menor, que quando tinha 4 anos, aprendeu a amarrar o cadarços do sapato sozinha. Eu não consigo amarrar os sapatos e por isso compro sapatos sem cadarço. Então ela me disse: “mamãe, agora você pode comprar todos os sapatos que quiser porque eu posso amarrá-los.” Hoje elas cresceram, são adolescentes e tempos atrás, disseram-me: “você é a mãe mais bonita do mundo, assim como você é, e não gostaríamos que fosse diferente.”

GIUSEPPE

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Giuseppe. Sobre uma mesa Giuseppe desenha. Estão espalhadas muitas folhas com esboços de esculturas. Ele é um homem de pela clara, cabelos grisalhos, usa óculos e veste camisa azul clara. No jardim, em meio a muita vegetação, está um banco e uma cadeira. Giuseppe caminha apoiado em uma bengala, vai em direção a esta cadeira, senta-se e deste lugar nos fala. Durante sua fala aparecem outras imagens: 1) Esculturas de corpos arredondados e alongados; 2) Dentro de um atelier Giuseppe organiza várias esculturas (como vasos altos) em tom areia e branco; 3) Suas mãos se movem enquanto fala e, ao mesmo tempo, mantêm-se fletidas; 4) No atelier vemos esculturas em forma de chapéus, sempre nas cores areia e branco. 5) Giuseppe desenha o esboço de uma escultura que representa o abraço entre duas pessoas e na sequencia, esta escultura em tom de areia é mostrada. 6) Anjos brancos rodeiam a gruta marrom onde está José, Maria e o pequeno Jesus. Giuseppe organiza as peças que fazem parte deste presépio. 7) Caminhando apoiado em sua bengala ele entra pela porta de uma casa com paredes amarelas e flores vermelhas diante das janelas abertas.

Sou Giuseppe. Sou casado e tive o dom de ter três filhos. Sou artesão e ceramista porque escolhi esta profissão. Encontro o limite, posso dizer, todos os dias, desde o momento que acordo, o esforço para me levantar, o esforço de dar os primeiros passos, o esforço de me vestir.

Para mim, é importante conhecer o meu limite, saber até onde posso chegar. Mas me pergunto, o que é o limite? Eu acredito que o meu limite faz parte da natureza. Instintivamente, a primeira coisa que faço é rejeitá-lo, negá-lo. O limite são as dificuldades, são as minhas inadequações, é sentir-me inferior, é não sentir-me à altura, mas também, o limite é não conhecer, é o medo, a incerteza, mas não só… também a tristeza, o fechamento em mim mesmo, a falta de esperança, o limite é não sentir-me amado, rejeitado.

GIUSY

Eis o que é para mim a riqueza deste laboratório: ser como sou, encontrar no caminho, feito juntos, a força para iluminar estes nossos passos na vida. Os limites permanecem, não são cancelados, porém é como se fossem iluminados, transformados por uma estranha alquimia.

GIUSEPPE                                      

Acredito que o limite é uma resposta inadequada a um desejo: “quero, mas não consigo”. Quanto maior é a distância entre o querer e a resposta, tanto maior é o sofrimento, o desconforto que posso experimentar. Unir o desejo com a capacidade de resposta. Ou melhor, unir o desejo com os meus meios. Não encontro a liberdade em fazer qualquer coisa, mas em poder fazer aquilo que me é possível. Amar, ir um pouco além do limite. E neste caso, quando consigo, a liberdade coincide com a minha realização humana. Com a alegria e a satisfação de uma vida plena.

LAURA

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Laura. Uma mulher dirige um trator em uma área rural e chega próximo a um prédio amarelo com aberturas alaranjadas. Ela tem cabelos curtos e grisalhos, veste blusa laranja e avental bordô. Manobra seu trator que está com um reboque carregado de cachos de uva. O reboque se eleva para que as uvas sejam descarregadas. Diante de uma videira Laura está de pé e nos fala. Durante sua fala temos as seguintes imagens: 1) Laura colhendo uvas na parreira, ora sozinha e ora acompanhada de outras pessoas; 2) Um balde grande e vermelho onde as uvas são depositadas; 3) Fotografia de uma competição de corrida com tratores; 4) Foto de Laura recebendo troféu e capa de um jornal com a notícia de sua vitória; 5) Estante com muitos troféus; 6) Laura liga o trator com um recurso que a auxilia segurar a chave.

Sou Laura, tenho 55 anos, vivo sozinha em Cadine, uma localidade próxima a Trento. Tendo nascido numa família de agricultores, desde pequena ia com meu pai para o campo. A minha grande paixão era o trator. Desde pequena papai vinha pegar-me com a moto na escola infantil e depois no curso fundamental me levava na região rural para dirigir o trator. Ele precisava ir e para mim era como um jogo.

Não via a hora de completar 18 anos para fazer a carteira de motorista e participar de competições. Durante cinco anos participei de competições em toda região trentina, fui vencedora e tornando-me campeã regional da gincana de tratores. Eu tinha vontade de viver, vontade de trabalhar, estando sempre atenta aos outros.

Aos 30 anos, sofri o primeiro impacto com a doença. Inesperadamente, comecei a ter dores articulares no joelho, com dores fortíssimas que me impediam de caminhar e subir as escadas. O diagnóstico foi artrite psoriásica. O médico me disse: “você deverá suportá-la por toda a vida”. Por um momento, vi minha vida desmoronar.

Começaram as consultas, os tratamentos. O primeiro ano foi muito difícil. Aconselharam-me usar alguns recursos para auxílios em atividades da vida cotidiana, muito importantes, muito úteis. E também os sapatos feitos sob medida, para mim são muito importantes.  Eu que sou habituada a arranjar-me sozinha, encontrando-me nestas condições tenho vontade de chorar. 

GIOVANNI

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Giovanni. A imagem de alguém que vestido de branco que anda em um corredor de hospital. No piso, diante de uma porta de vidro está escrito Terapia Ocupacional. A porta se abre. Em uma mesa está de um lado um homem vestido de branco, cabelos castanhos e óculos. Do outro lado duas mulheres de cabelos curtos e castanhos, uma de branco e outra vermelho. Eles se olham enquanto parecem conversar Desta mesa o homem nos fala enquanto vemos: Giovanni aponta para tela de um computador. Rodas de várias cadeiras.

Sou um médico especialista em reabilitação. Desde o início da minha profissão estive sempre fascinado pelo mundo das deficiências, sem entender bem o porquê desta atração.

Entrei em um grupo de limite, como associado, mas com o passar do tempo, me inscrevi plenamente. Eu também fiz a minha experiência de doença que chegou de forma imprevista, inesperada. Com os amigos do limite, aos poucos chegamos a aprofundar alguns elementos da realidade da deficiência.

Cada homem, ainda que sadio, experimenta durante toda a sua vida cotidiana momentos de limite. Seja porque estamos cansados, porque temos dor de cabeça, porque brigamos com alguém, porque o superior nos corrigiu… Em momentos assim nós não somos o máximo, trabalhamos no regime mais baixo, fazemos a experiência do limite. Então, parece-nos que a realidade da doença, da deficiência, pode ser considerada um livro aberto onde podem ser lidas muitas coisas para a vida do homem. Um livro aberto que temos sempre conosco, mas que na realidade não lemos suficientemente porque absorvidos pelas nossas realidades, pelos nossos problemas.

LAURO

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Lauro. Num parque de diversões um brinquedo gira em velocidade, vários balões e brinquedos coloridos, pessoas que brincam e uma casal, com um menino, está na roda gigante. Lauro possui cabelos castanhos curtos, usa óculos e veste azul. Sentado diante de um balcão de cozinha nos fala. Enquanto isso, algumas cenas são mostradas: 1) Casal de mãos dadas no parque enquanto os meninos brincam em carrinhos. 2) Cenas dos carrinhos se batendo 3) Família passeia entre os brinquedos 4) Pai joga bola com seu filho em um gramado.

Meu nome é Lauro, tenho 51 anos e sou enfermeiro em Rovigo. Há 4 anos convivo com Rita, depois de uma experiência matrimonial de cerca 11 anos. Há dois anos fazemos a experiência de adoção de um menino de 11 anos que nos foi confiado pelo serviço social. A minha experiência do limite é aquela de um contínuo cair e levantar-me, recomeçar, desacelerar, retomar o diálogo, ter que recuperar o relacionamento.

LAURA

A este ponto da vida, eu pensava em estar tranquila, e pelo contrário, tive um novo golpe. Anos atrás, me foi diagnosticado um tumor de mama. Falei com os amigos do Laboratório e me senti aceita e entendida, encontrando também nos outros, uma riqueza. Era como se a vida pudesse gritar ao mundo que vale a pena viver.

Em janeiro de 2014, foi descoberto um outro tumor, desta vez nos ossos. Foi um golpe muito duro, porém, procurei reagir logo, tendo já feito uma experiência forte da outra vez. Um pouco desta força eu encontro no meu caráter combativo, mas também na partilha com os amigos do Laboratório. Entendi que posso ser um dom para os outros, assim como eu sou. 

LAURO

Um ponto significativo, fundamental da experiência que fiz com o limite, foi a partilha. Encontrando-me com outras pessoas, comunicando as minhas dificuldades, encontro a força, o modo para recomeçar, partindo novamente. O que respondo a quem me pergunta: “o que você vai fazer neste Laboratório, com quem você se encontra, o que te transmitem?” Respondo: “a partilha é uma experiência fundamental, uma alquimia incrível que dá luz e dá esperança quando nos sentimos em dificuldade”.

MARCO, FRANCESCO, PATRIZIA, ALBERTO, ELISA

Descrição das imagens que aparecem durante a fala sobre Marco. Uma família composta de um casal e 3 filhos estão diante de um bosque e ao fundo grandes montanhas. O menino mais velho está sentado em uma cadeira de rodas. Em casa, o casal está sentado na cozinha com a geladeira ao fundo. Eles nos falam. Francesco, o pai, inicia a conversa e depois reveza com Patrizia, a mãe, e mais tarde os irmãos Alberto e Elisa. Durante o relato vemos: 1) Marco, rodeado por um grupo de pessoas, digita com ajuda da mãe o seu computador. 2) A mãe segura a mão de Marco e seu dedo indicador toca o teclado. 3) O irmão (Alberto) lê um escrito de Marco 4) Diante de uma estante de livros um troféu, um caminhãozinho vermelho e a foto de Marco. 5) Fotografia de Marco com seu irmão 6) Na estante uma bola de futebol e a foto de um time com camisas azuis 7) Foto de Marco no campo e ao fundo pinheiros. Ele está com seu irmão e sua irmã, um de cada lado. 8) Elisa (irmã) lê uma mensagem escrita por Marco. Ela está em uma mesa decorada em tons de rosa. 9) Fotografia de Elisa dando um beijo em Marco 10) Foto de Marco ao lado e de braços com um homem adulto, participando do “laboratório”.

Francesco (papa): Cuando Marco nasceu logo apareceram as dificuldades que com os anos aumentaram e a deficiência se tornou mais importante. Não falava, mas com 8 anos conseguiu comunicar-se utilizando o computador.

Patrizia (mama): Com auxílio do computador desde então, Marco sempre pode exprimir as suas necessidades mas, sobretudo, abrir-nos o seu coração e fazer-nos entender o que realmente ele continha: um tesouro incrível.

Alberto (irmão): 13 de fevereiro de 2010. “Caro Albi (Alberto) desejo-lhe muitos votos de feliz aniversário. Depende de você fazer aquilo que acredita ser correto e encontrar a seu caminho entendendo que aquilo que nunca deve faltar numa vida feliz, seja o que for que você faça, é a vontade de amar e a confiança de deixar-se amar. Boa festa e bom caminho. Marco”

Elisa (irmã): Batismo de Elisa, 26 de setembro de 2004: “Entre as nuvens tenras de uma incerta primavera, chegou um buquê rosa como um dom divino nos presenteou com um novo sonho. Peço-te Jesus: doa-lhe mais, mais que um sorriso, mais que o Paraíso, doa-lhe o Teu amor e estreita-a ao Teu coração. Desenha-lhe um futuro num mundo menos duro. Marco

Patrizia (mama): Desde a idade de 15 anos, Marco começou a frequentar o Laboratório “ para além do limite” até a idade de 18 anos, quando partiu para o Céu.

CHIARA M.

Descrição das imagens que aparecem durante a fala de Chiara M. Em uma trilha num bosque uma mulher de cabelos pretos e curtos conduz sua cadeira motorizada. Durante o passeio encontra um casal com um bebê no carinho.  Segue seu percurso. Em dia ensolarado, Chiara em sua cadeira contempla a vista em meio às montanhas.

Sou Chiara e moro em Trento. Trabalhava como enfermeira profissional no hospital da minha cidade até quando uma série de eventos me levou “para a outra parte”.

Sempre fui atraída por este tipo de profissão porém, apesar disso, aprendi com os anos que aquilo que se estuda como enfermeira, não leva realmente aquele conhecimento particular, profundo da dor, do sofrimento, até quando não se experimenta pessoalmente.

Eu me lembro das minhas primeiras internações no hospital. Um visual na horizontal, como gosto de definir. Desta perspectiva tudo assume uma ressonância diferente. Você está de pijama, deixou lá fora a sua identidade, tornou-se um número, um diagnóstico, se tiver a sorte de tê-lo. Tem tempo em abundância. Para observar, escutar, pensar, sofrer, conhecer a solidão. O dia é permeado de gestos, olhares, palavras, sons, odores.

O médico que entra no quarto é “radiografado” automaticamente. A expressão do rosto, o tom da voz, os seus gestos. Quando ele entra e diz a todos indistintamente, bom dia, eu sinto a diferença se o diz a mim, aproximando-se do leito. Porque aquele bom dia é para mim, eu me sinto “pessoa” naquele momento. Ou o sorriso que recebo da enfermeira quando vem me atender, virar o travesseiro, medir a pressão, é uma carícia interior que ressoa no profundo. O calor de um gesto quando, por exemplo, me é entregue um relatório médico negativo, ou quando me é comunicado algo difícil ou doloroso que virá a acontecer, vale mais que discursos, humanizam a crua realidade.

GIOVANNI

Como se tornaria, por exemplo, o mundo da pedagogia, da educação escolar, se colocasse no centro o conceito do limite? Não ajudaria as jovens gerações a acolher-se, a aceitar-se como são, com os seus limites psicológicos, físicos? Não ajudaria rapidamente a aceitar o outro quando o encontramos?

E o mundo da saúde, se colocássemos no centro a ideia do limite, o limite que vive o médico, quando se esforça para encontrar o diagnóstico, a terapia, o limite que vive o doente na sua carne. Não ajudaria a levar o tratamento para uma realidade de relação, de reciprocidade?

E na política? Como seria vivida se tivesse no centro esta experiência do limite, como seria organizada a convivência de uma comunidade humana, como se tornaria bem- estar social, se colocasse ao centro o limite?

CHIARA M.

Eu gostava muito de me movimentar, correr, subir e outras coisas mais. Porém, a vida não é só poesia e encontrei-me dentro de um sonho quebrado. Tive que, aos poucos, recolher os pedaços, com esforço e às vezes rebelando-me, para procurar recompor alguma coisa completamente diferente daquilo que eu teria imaginado.

O encontro com os amigos do Laboratório permitiu amadurecer dentro de mim a consciência da importância daquilo que a sociedade considera “diferente”, da riqueza de cada um de nós, da potencialidade.

Gosto de imaginar-nos como um caleidoscópio. Tantos pedacinhos de vidro coloridos, distintos mas unidos, atravessados pela luz, ao mínimo movimento, conseguem compor sempre novos e maravilhosos desenhos plenos de harmonia, prontos para serem doados. 

FINAL

Descrição das imagens que aparecem no final. Na cidade de Maróstica, no centro da praça rodeada de arquibancadas entram duas mulheres (Antonella e Chiara) em suas cadeiras de rodas.  Personagens com roupas antigas atuam e a plateia aplaude. Os protagonistas deste filme estão na plateia. Enquanto soa a música a imagem passa entre atores e plateia. O grupo do laboratório se reúne e conversa com alguns atores. Uma vista da praça e um castelo ao fundo. A tela escurece e lemos os créditos do filme enquanto a música toca.

Transcrição da música final (autor: Chiara Grillo)

Ao longo das novas terras fluem os momentos que você amou,alegria profunda que reúne em si a pérola do seu coração. E tudo cresce ao nosso redor em uma só verdade: permanece apenas o amor. Nessa música estamos aqui, em sua nova liberdade: asas abertas para voar com você. As pessoas passam e já percebem aquele paraíso que o amor faz surgir dentro de nós. Você é aquela música que flui entre nós, é você quem o rastro da beleza que tem. Como num passe de mágica, você está aqui na alma.